Dói ainda dói e, sinceramente, não sei se vai parar de doer, sei que ameniza, após quase dois anos não é tão desesperador como foi no início. Mas a injustiça incomoda profundamente. As vezes choro de saudade, outras de indignação, muitas de tristeza e assim a vida continua, sem que estejas nela. Quando estou em Pelotas vou até a tua mãe, nunca mais na tua casa, logo vem as lágrimas só de olhar, as janelas estão sempre fechadas, diferente de quando vivias lá, eram abertas para o sol entrar e o ar renovar o ambiente. É desolador. Me lembra a casa da minha avó depois da morte dela, a alma da casa partiu junto com a sua dona. Não existe mais vivacidade, apenas melancolia. Dói voltar ali, é triste ver as ruínas da tua partida. Minha amiga não foi só a ti que levaram, tiraram muito mais, nos roubaram as belas imagens de felicidade do teu jardim, do teu pátio, do teu lar.
Mês: março 2017
Humanidade
Eu não sei se a ossada é da Cláudia, como li em quase duzentos comentários feitos na reportagem sobre o descobrimento de um esqueleto num bosque. Levei um choque ao receber a notícia, sempre é assim, desde o primeiro corpo encontrado, há quase dois anos. A cada informação de que não era ela vinha uma grande sensação de alívio. Hoje tive vários sentimentos, primeiro veio a raiva dos comentários, será que as pessoas pensam que não lemos?! Depois os desculpei interiormente, faz parte, as redes sociais deram a impessoalidade a quem comenta, o computador, o celular são aparelhos, fica mais fácil ser frio atrás dos mesmos, é assim. Depois me dividi, parte de mim pensou, se for ela ao menos terá um enterro digno, ao mesmo tempo que a ínfima esperança de vida ruirá de vez. Ao pensar no que li me ocorreu outro momento de raiva, também estava escrito que os ossos estavam espalhados, provavelmente algum animal se alimentou, gente um jornalista é treinado para informar, mas ele pensou em quem lê?! Quem quer ler que o seu ente querido serviu de comida para animais?! Óbvio que interiormente se sabe tudo o que pode ter acontecido, mas não quero ler isso, é cruel. Toda essa impessoalidade trouxe menos sensibilidade e está faltando tato, somos humanos, ou não?! Já li muitas coisas desde o dia em que a Cláudia desapareceu, vivemos em uma montanha russa de sentimentos, machucados, sensíveis, prefiro me calar muitas vezes, mas tem dias que gostaria que as pessoas tentassem se colocar no lugar do outro, só isso. Também consigo entender que é muito difícil, uma pessoa querida sua desaparecer é quase impossível, mas aconteceu conosco e não é nada fácil pensar que ela pode ser esse esqueleto.
Privação
Nunca consegui me acostumar com a perda de quem amo, apesar de ter conhecido a morte muito cedo na minha vida, convivi com a do meu pai aos dez anos, perdi um tio querido aos quatorze, na véspera dos meus quinze anos, depois uma filha aos dezoito, minha avó amada aos 22, meu único irmão e padrinho há dez anos. A vida sempre me disse que seria assim, mas e daí?! Não há consolo na privação de quem se ama. O tempo apenas nos faz encarar os dias e a rotina até a dor abrandar. Então lá vai você na cara e na coragem, com as lembranças do início, meio e fim. Em vários dos meus momentos tu estavas junto e, como amiga, me destes suporte. O que acho insuportável é não ter, ver um final na tua história, apenas um abrupto desaparecimento. No início vivemos de uma esperança, a da tua volta, não conseguíamos enxergar que tinhas nos deixado. Não, nunca nos deixastes, te arrancaram da tua vida e do nosso convívio. E nisso não há um fim, tem sido pior que a morte. Não desejo que ninguém passe por isso. Não tem como se acostumar, nada se encerra, em ínfimos momentos ainda penso na tua volta, aí sou obrigada a abandonar a fantasia e voltar para a dura realidade, não haverá retorno, não te temos mais conosco, em nada, nem para prantear.